quarta-feira, 17 de julho de 2019

quarta-feira, 10 de julho de 2019

Capitão América




O nosso Capitão América é, na verdade, baiano. Tem 36 anos, bem menos idade que o personagem das HQs, criado por Joe Simon e Jack Kirby. E ainda que o herói da Marvel tenha derrotado seus inimigos e salvado o planeta inúmeras vezes, ninguém no mundo conquistou mais troféus que Daniel Alves — com o de domingo são 40, três a mais que ninguém menos que Pelé. Na média, o baiano de Juazeiro é campeão mais de duas vezes por ano.

Em 2007 ele estava lá: só que no banco de reservas. Na decisão da Copa América contra a Argentina, em Maracaibo, Daniel entrou ainda no 1° tempo no lugar de Elano e foi decisivo. Foi dele o cruzamento em que o zagueiro Ayala desviou para as próprias redes; foi dele o terceiro gol da goleada de 3 a 0, depois de receber um belo passe de Vágner Love. Naquela tarde de domingo, Daniel conquistava seu primeiro título com a camisa amarela, enquanto a Seleção Brasileira vencia a terceira final consecutiva contra os argentinos e sua última Copa América, até então.





















12 anos se passaram, e o Brasil estava de volta à decisão. Entretanto, o adversário não era nenhum dos bichos-papões do continente: muito pelo contrário, já havia sido goleado pela própria seleção canarinho na fase de grupos. Só que o começo do jogo fez o torcedor esquecer aquela goleada na Arena Corinthians. Num Maracanã lotado, ávido por um título, quem tomou a iniciativa foi o Peru. O time de Gareca não se acovardou, adiantou a marcação e deixou a Seleção sem saída. Mas o fraco lado esquerdo peruano logo sucumbiu ao talentoso lado direito brasileiro: o primeiro gol saiu de um lançamento de Daniel Alves, um drible desconcertante de Gabriel Jesus em Trauco e a chegada oportunista de Everton por trás de Advíncula.

O Peru conseguiu o empate ainda no 1° tempo graças ao VAR, que enxergou um pênalti no braço de apoio de Thiago Silva. A fraca arbitragem do chileno Roberto Tobar foi na onda do árbitro de vídeo, o que fez cair por terra as suspeitas de Messi sobre uma armação para o Brasil ganhar a Copa América. Melhor para Guerrero, que converteu seu terceiro gol na competição, empatou na artilharia com Cebolinha e,     pela terceira vez, se consagrou como maior marcador de uma edição de Copa América — antes dele, só o uruguaio Pedro Petrone, na década de 20.




A Seleção Brasileira não se abateu em nenhum momento. Pelo contrário: foi mais time do que nunca. A defesa manteve-se sólida, o meio-campo produtivo e o ataque decisivo. Dos pés de Firmino saiu o carrinho para roubar a bola de Yotún, que Arthur conduziu até dar o passe para Gabriel Jesus. O camisa 9 contou com o escorregão de Zambrano para ajeitar, olhar e tocar no cantinho de Gallese. Depois de ser execrado na Copa do Mundo, Gabriel Jesus voltava a sorrir como destaque ofensivo, com gols e assistências.

O Brasil do 2° tempo pareceu mais ajustado. Coutinho teve duas boas oportunidades, mas no primeiro lance foi bloqueado e no segundo adiantou demais a bola. Aí veio a injusta expulsão de Gabriel Jesus, e o atacante trocou o sorriso pela violência e as lágrimas. Com um a mais, o Peru se fortaleceu. Militão entrou — estreou — e o time não passou sufoco. Com espaço, criou chances. No último grande lance da partida, Everton trombou com Zambrano e um novo pênalti foi mal marcado. A cobrança de Richarlison sacramentou a vitória brasileira e a ressurreição do jogador que há 10 dias estava isolado num quarto, com caxumba.

Foi a vitória do time solidário, onde todos tiveram espaço para brilhar: Everton foi eleito o melhor em campo, Alison, o melhor goleiro do torneio e Daniel Alves, o melhor jogador da Copa América — ele diz ter fôlego para chegar ao Qatar.

E ninguém sentiu a falta de Neymar.



quarta-feira, 3 de julho de 2019

O Retorno do Messias




O povo de Israel esperava ansiosamente pelo Messias. Os judeus acreditavam que ele seria uma figura política e religiosa, que iria restaurar a independência e a glória do país. Nesse meio tempo, houve quem alegasse ser o salvador ungido por Deus, o que gerou discórdia com os opressores romanos. Mas nenhum desses falsos Messias conseguiu fazer alguma coisa. Até que apareceu Jesus.


Ontem, no duelo do Mineirão, os candidatos a Messias eram alguns. A começar por Lionel Messi, que precisava provar não ao mundo, mas ao povo argentino, que é capaz de trazer o futebol platino de volta à luz. Descontraído, ele abraçou Daniel Alves na saída do túnel para o gramado, sem saber que o antigo parceiro de Barça seria outro forte candidato. Agüero, Coutinho, Everton e Lautaro também concorreram, mas ninguém conseguiu fazer alguma coisa. Até que apareceu Jesus.




O gol brasileiro aos 19min de partida foi uma pintura. Nos fez rapidamente esquecer que, há 5 anos, no minuto 19 de outra semifinal no Mineirão, o Brasil já perdia por 1 a 0 e estava na eminência de levar mais quatro gols ainda no 1° tempo. Teve rolinho de Coutinho, chapéu de Daniel e cruzamento de Firmino. Até que apareceu Jesus e empurrou a bola para dentro. 725 minutos depois de marcar seu último gol pela Seleção — em outubro de 2017, contra o Chile pelas Eliminatórias da Copa da Rússia —, Gabriel voltou a balançar as redes. O menino Jesus ainda deu uma linda arrancada no 2° tempo, levou uma trombada atrás da outra e, sem cair, serviu Firmino, que fez o segundo. A vitória por 2 a 0, enfim, convenceu.

A camisa 9 da Seleção é tão pesada quanto a 10. Já estamos há duas Copas do Mundo sem um centroavante de peso — Ronaldo Fenômeno literalmente foi o último. As pazes de Gabriel Jesus com o gol elevam a esperança de o Brasil voltar a ganhar títulos — o último foi há 6 anos, contra a Espanha pela final da Copa das Confederações, também a última vez que a Seleção jogou no Maracanã.

E Messi? Teve sua melhor atuação na Copa América, mas não foi o suficiente. Deu uma canseira no rival de Espanha, Casemiro, finalizou mais que qualquer um na albiceleste e chutou uma bola na trave de Alison — teve outra, numa cabeçada de Agüero. Mas vai embora com apenas um gol marcado, na seca de não conquistar títulos pela seleção principal da Argentina.

Se de um lado retorna o Messias, do outro temos o retorno de Messi... para casa.



segunda-feira, 1 de julho de 2019

Rivais Pacíficos




A França é a atual campeã do mundo. Portugal, da Europa. E o Chile levantou o caneco nas duas últimas Copas Américas. Mas o que conta para uma seleção de futebol ser considerada grande é a história; e isso o Brasil tem de sobra. E como todo gigante que se preza, tem sempre aquele dia de Davi. Em 1950, nasceu o Maracanazo. Em 2014, aconteceu o 7 a 1. Com essas duas desgraças da bola, a Seleção Brasileira conseguiu acabar com todas as estatísticas favoráveis dentro de casa. Entretanto, ainda restou uma: jamais perdeu para a Argentina no Mineirão — na última apresentação, em 2016, válida pelas Eliminatórias da Copa da Rússia, goleada brasileira por 3 a 0.



Calma, o Brasil ainda é favorito por jogar em casa contra uma Argentina capenga. Mas a Seleção, salvo os 5 a 0 sobre os peruanos, não fez muito mais que os hermanos no torneio. As duas equipes chegam para o embate em pé de igualdade: um nível abaixo do que se esperava. Talvez seja o pior Brasil x Argentina da história em nível técnico, mas, com certeza, será um dos melhores em emoção, ainda mais que a decisão por pênaltis tem sido uma tendência nesta edição. O fato é que a Argentina, desorganizada, sem defesa e com Messi em má fase, foi a única seleção capaz de marcar gols em 360 minutos de quartas de final — Brasil, Chile e Peru obtiveram suas classificações nos pênaltis após 90 sofríveis minutos sem gols.

Mas se você acha que a rivalidade entre Brasil e Argentina é a maior das semifinais da Copa América, você precisa conhecer melhor a relação entre peruanos e chilenos. O duelo entre os dois nunca se limitou ao futebol, graças a uma área rica em recursos minerais, como salitre e cobre, que despertou a chamada 'Guerra do Pacífico', travada entre 1879 e 1883. O Chile se saiu vencedor, anexou ao seu território a província de Taracapá, do Peru, e Antofagasta, da Bolívia, deixando os bolivianos sem saída para o mar. Até hoje os países disputam a soberania sobre esses territórios na justiça — uma disputa tal qual o oceano, pacífica.

Na primeira Copa América conquistada pelo Chile, em julho de 2015, as seleções se enfrentaram também nas semifinais. Melhor para os chilenos, donos da casa, que venceram o grande rival por 2 a 1 e foram à decisão. No último encontro entre os dois, em outubro de 2015, o Chile voltou a vencer o Peru, por 4 a 3, em jogo das Eliminatórias realizado em Lima. O então campeão da América deixou um recado na parede do vestiário do Estádio Nacional de Lima. "Respeito! Por aqui passou o campeão da América", em resposta às provocações peruanas antes e durante a partida.

Não tem jeito. O orgulho ferido dos peruanos sempre entra em campo quando do outro lado estão os chilenos.



sexta-feira, 28 de junho de 2019

As Guerras do Paraguai




Numa manhã tranquila de junho de 1865 as tropas paraguaias de Solano López desembarcaram perto de São Borja, às margens do Rio Uruguai, e foram recebidas com tiros de carabina pelos gaúchos. O ditador alimentava o sonho de formar o Grande Paraguai, que abrangeria as regiões argentinas de Corrientes e Entre Rios, o Uruguai, o Mato Grosso, o próprio Paraguai e, claro, o Rio Grande do Sul. Para ele, Porto Alegre era um ponto estratégico da batalha, porém jamais conseguiu alcançar as cercanias da cidade. A rendição paraguaia veio três meses depois, em Uruguaiana, e o conflito contra a Tríplice Aliança (Brasil, Argentina e Uruguai) só terminou em 1870. Um século e meio depois, os paraguaios finalmente chegaram à capital gaúcha. E travaram mais uma guerra de nervos.





O duelo entre Brasil e Paraguai pelas quartas de final da Copa América de 2019 foi tenso, como sempre. Postada numa linha defensiva de cinco jogadores, a Albirroja mostrou o que sabe fazer de melhor: se defender. Parece que, enquanto aqui as crianças sonham em ser um Pelé, lá em Assunção elas almejam ser um Gamarra. Os paraguaios são viciados em empates, adoram uma retranca e, pior do que isso, viraram nossos algozes — perdemos nos pênaltis para eles as Copas Américas de 2011 e 2015. Que currículo o da Seleção Brasileira: duas derrotas na marca da cal para um time que só tem uma vitória na década pela competição continental.

Foi um massacre do primeiro minuto do 1° tempo até os 52 do 2° tempo. A Seleção finalizou 25 vezes ao gol de Gatito e teve nove chances reais de gol. Não foi à toa que o goleiro botafoguense saiu de campo eleito o melhor jogador da partida pela quarta vez seguida no torneio. Isso porque o Brasil jogou praticamente a segunda etapa inteira com um homem a mais, depois que o VAR dedurou ao árbitro chileno Rodrigo Vargas que não tinha sido pênalti de Balbuena em Firmino — ele expulsou o defensor paraguaio. Mas o que Gatito fez nos 90 minutos, não fez nos pênaltis. Não pegou nenhuma cobrança brasileira e deixou a glória da pequena área para o goleiro campeão europeu pelo Liverpool. Alisson, ídolo do Internacional, foi herói na casa do antigo rival: pegou a cobrança do palmeirense Gustavo Gómez e ajudou na classificação canarinho às semifinais.

Lá se foram os fantasmas dos pênaltis de Elano e André Santos nas nuvens, de Thiago Silva telegrafando nas mãos de Villar, de Fred errando à meia altura, de Everton Ribeiro rolando para fora e de Douglas Costa botando por cima. A guerra dos pênaltis contra o Paraguai, depois de longos oito anos, chegou ao fim.


Mas qual Brasil chega às semifinais da Copa América após 12 anos? A Seleção inoperante contra Venezuela e Paraguai ou a Seleção eficiente contra Bolívia e Peru? Boa pergunta.