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O encontro
entre os líderes Montezuma II e Hernán Cortés, em 8 de novembro de 1519, no
palácio de Axayacatl, não teve agendamento prévio, confirmação por e-mail, troca
de cartões, ata, cobertura da mídia e muito menos cafezinho. Ainda assim, foi
uma importante reunião de negócios. O imperador asteca quebrou o protocolo e
presenteou o conquistador espanhol com flores de seu próprio jardim — a mais
alta honraria do império. Acreditando que Cortés era o enviado do deus asteca
Quetzalcóatl, Montezuma II suspendeu todos os sacrifícios humanos. No final, eles
apertaram as mãos.
Depois ter sido recebido de
braços abertos, Hernán Cortés aprisionou o imperador que havia declarado
fidelidade ao rei Carlos V. Os espanhóis dominaram Tenochtitlán (atual Cidade
do México) e destruíram o império asteca. Antes de morrer, Montezuma II proferiu
uma maldição: todo o estrangeiro que pisasse em solo mexicano seria acometido por
um profundo mal estar, o qual foi chamado de “Mal de Montezuma”. Em 1970, o
goleiro inglês Gordon Banks foi amaldiçoado.
O encontro entre Montezuma II e Hernán Cortés. O conquistador espanhol cortou o coração do imperador que cortava cabeças. |
Brasil x Inglaterra era o
jogo mais esperado da primeira fase. O confronto de campeões entre o bi mundial
e a defensora do título correspondeu às expectativas. Sem Gérson, reprovado nos
exames médicos, a seleção canarinho teve, mais uma vez, dificuldades diante dos
ingleses. A começar pelo lance mais célebre da partida, e um dos mais marcantes
da história das Copas.
A jogada teve início com
Carlos Alberto, que enfiou de três dedos para Jairzinho, nas costas do lateral
Cooper. Jair se livrou do rival, foi à linha de fundo e cruzou a bola a
centímetros de sair. Pelé e Wright subiram juntos, e a bola escolheu quem
sempre a tratou melhor. O Rei cabeceou firme para o chão, de olhos bem abertos,
como só ele sabia fazer. E gritou gol.
Pelé sobe para testar. A cabeceada do Rei era tida como uma das mais perfeitas execuções do movimento. |
Porém, num lapso de segundo,
o goleiro Banks mostrou todo o seu reflexo debaixo das traves. Com um tapa, ele
desviou a bola para o alto. Escanteio. Tostão não acreditou, tampouco Bobby
Moore. Se Pelé marcou um “gol de placa” em 61 (contra o Fluminense, no
Maracanã), naquela tarde, o segundo “não-gol” do Rei em 70 proporcionou a Banks
uma “defesa de placa” — eleita a maior de todos os tempos.
A Rainha já sabia. Um dia antes da partida, o goleiro havia recebido a Ordem do Império Britânico, passando a fazer parte da galeria dos ingleses mais notáveis de todos os tempos. |
Pouco depois, Lee teve a
chance de fazer o que Pelé não fez. Mas cabeceou em cima de Félix, livre de
marcação. O primeiro tempo terminou em branco. No intervalo, com o sol a pino —
a partida começou ao meio-dia —, o time brasileiro demorou cinco minutos a mais
para voltar dos vestiários. Os jogadores ingleses, que retornaram no tempo
previsto, ficaram expostos ao sol quente à espera dos brasileiros. Sorte do
goleiro Banks, que conseguiu se proteger na sombra da trave.
O único gol do jogo saiu aos
14min do segundo tempo. E foi memorável. Tostão deu um chega pra lá em Alan
Ball (com o braço), um ‘rolinho’ em Bobby Moore (com o pé esquerdo) e cruzou (de
direita), depois de deixar Wright no chão. Pelé amorteceu a bola e esperou a
chegada dos desesperados ingleses. Com classe, ele rolou para o lado e Jairzinho
veio como um foguete: ajeitou e encheu o pé na saída de Banks. Desta vez, o
goleiro nada pôde fazer: Brasil 1 a 0. Alan Ball ainda chutou uma bola no
travessão de Félix, antes do apito final decretar a vitória brasileira.
Pela alegria de Pelé e Bobby Moore fica difícil saber quem saiu vitorioso. O Rei disse que Moore foi o "melhor zagueiro com quem já jogou contra, além de ser um cavalheiro." |
Nem tudo estava perdido para
os súditos de Sua Majestade. Na terceira rodada, os ingleses venceram os
tchecos pelo placar mínimo e se classificaram para as quartas de final. O
adversário era nada mais nada menos que a Alemanha Ocidental, que queria
revanche da final da última Copa.
Confiante, Bobby Moore
chegou a declarar que o English Team já estava esperando o adversário na final.
O capitão inglês só não contava com uma refeição mal digerida por seu
guarda-meta. Na véspera da partida contra os germânicos, Gordon Banks se
esbaldou num banquete apimentado e regado a muita tequila, na concentração. No
dia seguinte, foi obrigado a trocar o campo de jogo pelo banheiro. Os médicos
ingleses constataram um impiedoso desarranjo intestinal. Mas os mexicanos não
tinham dúvida: o “Mal de Montezuma” havia atacado mais uma vez.
Sem o seu “Bank of England”
(apelido do goleiro Banks, em razão da segurança transmitida), o técnico Alf
Ramsey escalou o reserva Peter Bonetti, que também sofria do mesmo mal, e não
informou à delegação britânica. As câmeras captaram durante toda a partida as expressões
faciais do arqueiro indisposto. A Inglaterra chegou a abrir 2 a 0 no marcador,
com Mullery e Peters, mas permitiu a reação alemã. Beckenbauer e Seeler levaram
a partida para a prorrogação. Esgotados, os ingleses
sucumbiram com um gol de Gerd Müller, que aproveitou a bola alçada na área e,
livre na pequena área, virou o placar para 3 a 2.
Müller marca seu oitavo gol na Copa. A Alemanha Ocidental estava vingada e nas semifinais. A atual campeã, derrotada e eliminada. |
Para muitos, a ausência de
Banks foi determinante para a eliminação da Inglaterra. Assim como o goleiro
inglês, inúmeras pessoas já foram vítimas da suposta “vingança” do imperador no
decorrer dos anos. Entrentanto, mais do que uma praga do asteca, a eliminação inglesa
foi uma lição ao time mais presunçoso que a Copa do Mundo já viu.
7/6/1970 – Guadalajara – Brasil 1 x 0 Inglaterra — Melhores Momentos
Excelente! A ilustração do encontro de Montezuma com Cortés é realmente extraordinária.
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