A Copa do Mundo de 34 teve a menor média de público
entre todas as 19 edições, mas em nenhuma outra houve um espectador tão assíduo
quanto Benito Mussolini. Interessado em tirar o máximo de proveito político da
competição, o ditador fascista realizou a milagrosa missão de acompanhar
pessoalmente todas as partidas do Mundial. Há quem duvide de tal feito, mas em
se tratando da Copa de 34, não se pode duvidar de nada.
Naquela época, a Europa assistia à ascensão dos
regimes totalitários na Alemanha de Hitler e na Itália de Mussolini. Com um
discurso inflamado na falsa premissa de superioridade, as competições
esportivas eram usadas para alimentar o sentimento nacionalista. No caso da
Copa, “Il Duce” (o condutor supremo da Itália) utilizou os estádios como arenas
políticas.
A seleção da casa cumprimenta o ditador presente ao estádio. |
Apesar de ser uma das melhores seleções da Europa, a Itália precisava se firmar como superior. Para fortalecer a Azzurra, Mussolini saiu pelo mundo garimpando craques. O brasileiro Filó foi um deles, atuando com o seu sobrenome Guarisi. Além dele, os argentinos Monti — vice-campeão em 30, pela Argentina —, Guaita e Orsi se juntaram ao time.
Com o sucesso da primeira edição e o interesse de
vários países, foi necessária a disputa de eliminatórias para a Copa do Mundo.
E pela única vez na história, o anfitrião teve que passar por um jogo
classificatório para garantir vaga no torneio que organizaria — a Itália despachou
a Grécia, por 4 a 0.
O Uruguai, atual campeão, recusou-se a participar, em
resposta ao boicote europeu quatro anos antes, tornando-se, assim, o único país
a não defender o título na edição seguinte. Se o Mundial de 30 foi uma
autêntica Copa América, a de 34 foi uma verdadeira Copa Europeia: dos 16 times,
12 eram europeus. E a África, pela primeira vez, teve um representante: o Egito.
O estádio do Partido Nacional Fascista, em Roma. |
Com a bola rolando, a hegemonia europeia mostrou-se
evidente. A Itália massacrou os Estados Unidos (7 a 1), o Brasil caiu frente à
Espanha (vide ‘O Canto da Sereia’), o Egito foi eliminado pela Hungria (4 a 2)
e a Argentina perdeu para a Suécia (3 a 2). Dessa forma, as
oito seleções classificadas para a fase seguinte pertenciam ao Velho
Continente.
Nas quartas, em um confronto cercado de erros, a
Azzurra precisou de dois jogos para eliminar a Espanha — em caso de empate na
prorrogação, um novo duelo. No primeiro deles, o gol irregular de Ferrari, aos
45min, empatou a partida em 1 a 1 e tirou o goleiro Zamora do jogo-desempate,
contundido.
No dia seguinte, a arbitragem foi conivente com a
violência dos anfitriões — o espanhol Bosch levou uma pancada e passou o resto
da partida mancando. A Itália fez 1 a 0 no 1° tempo, com Giuseppe Meazza, e
depois viu, no 2° tempo, o árbitro anular dois gols aparentemente legítimos da
Espanha. A partir de então, a seleção espanhola ficou conhecida como “A Fúria”.
Apenas 48 horas depois, a Azzurra voltou a campo, pelas
semifinais, para encarar a Áustria, o “Wunderteam” (“Time Maravilha”). Os austríacos
só não contavam com a chuva torrencial, que encharcou o gramado, igualou as
condições de jogo e possibilitou à Itália vencer a partida (1 a 0, gol de Guaita).
No dia 10 de junho de 1934, em Roma, sob os olhares atentos de Mussolini, a Itália enfrentou a Tchecoslováquia pressionada para conquistar o título. O líder fascista contava com o apoio de 50 mil torcedores e a admiração política confessa do sueco Ivan Ekling, árbitro da final.
Benito Mussolini foi professor, jornalista e escrevia para jornais de esquerda, antes de se tornar "Il Duce". |