quinta-feira, 27 de março de 2014

1962 | Fios de Esperança

Para ler o texto anterior, "1958 | A Taça do Mundo É Nossa", clique aqui.


Numa escala de 0 a 10, chegar a 9,5 é praticamente atingir o auge. Seria realmente o máximo se estivéssemos falando de uma prova na faculdade, uma avaliação na academia ou do grau de satisfação com o SAC de uma operadora de celular. Mas os 9,5 em questão referem-se à magnitude do terremoto mais violento já registrado cientificamente na face da Terra. Ele ocorreu no dia 22 de maio de 1960, no Chile, dois anos antes da Copa do Mundo naquele país.

O “Grande Sismo do Chile” atingiu toda a região centro-sul do território chileno, com foco nas cidades de Valdivia e Concepción. Provocou a erupção de um vulcão nos Andes e um tsunami que atravessou o Pacífico até o Havaí e o Japão.

Os prejuízos foram incalculáveis. O número de vítimas chegou a 5.700. Mais de dois milhões de chilenos ficaram feridos. Três dias após o desastre, cerca de mil pessoas faleceram por doenças causadas pela sujeira e esgoto a céu aberto. Um ano depois, réplicas do primeiro abalo ainda podiam ser sentidas. A Copa de 1962, por pouco, não se realizou.

Coube a um brasileiro, naturalizado chileno, salvar o Mundial. Carlos Dittborn era presidente da Conmebol quando o país ganhou o direito de sediar o evento. As obras de infraestrutura iam de vento em popa, mas o tremor lançou incertezas sobre a capacidade do Chile em abrigar o torneio depois da tragédia.

 Dittborn pediu um voto de confiança à FIFA, que lhe deu. Sob o lema “Porque nada tenenos, lo haremos todo” (porque nada temos, faremos tudo), as obras foram concluídas em tempo recorde — o que nos faz pensar, como brasileiros, o quanto somos incompetentes. Contudo, Dittborn sofreu um ataque cardíaco a um mês da Copa e não pôde ver o resultado de seus esforços.

A cidade de Concepción devastada após o tremor: 25% da população chilena ficou desabrigada.

A Copa do Mundo de 1962 só não foi um fiasco de público graças ao time da casa. Os torcedores chilenos só se interessavam pelos jogos de sua seleção. Enquanto o Chile tinha mais de 60 mil espectadores por partida, a média das outras equipes ficou abaixo dos 10 mil. Foi o terceiro pior público em Mundiais, perdendo apenas para as Copas de 30 e 34.

O torneio marcou o fim das partidas extras para decidir vagas, em caso de empate por número de pontos. Passou-se a adotar o saldo de gols como primeiro critério de desempate, o que perdura até os dias de hoje.

Também foi a última Copa do Mundo a não ser transmitida ao vivo para a Europa, uma vez que o satélite Telstar ainda não havia sido lançado ao espaço. No Reino Unido, a BBC transmitiu os jogos ao vivo via rádio e, nos cinemas, no dia seguinte à realização das partidas. No Brasil, a torcida sofreu um pouco mais: os videoteipes chegavam de avião e eram exibidos com dois dias de atraso.

Na Praça da Sé, em São Paulo, a população acompanha, pelo rádio, partida do Brasil na Copa de 62.

Problemas com doping e naturalizações foram discutidos uma semana antes do início do Mundial, e ficou decidido que, a partir da Copa de 66, um jogador só poderia atuar por uma seleção se nunca tivesse jogado por outro país em jogos oficiais. Quanto ao uso de substâncias proibidas, a falta de uma legislação antidoping em grande parte das nações participantes — apenas a Itália possuía — impossibilitava qualquer controle.

A FIFA queria evitar casos como o do argentino Alfredo Di Stéfano, da Espanha. Além de trocar de seleção, o craque não via problemas em um jogador tomar estimulantes — o que leva a imaginar que alguns atletas poderiam ter usado substâncias para melhorar o desempenho dentro de campo durante a competição.

De certo era que o Brasil chegava à Copa sob nova condição: a de detentor do título. E para defender sua conquista, manteve a mesma base do Mundial anterior. Com Didi, Vavá, Zagallo, Pelé e Garrincha, a Seleção Brasileira tinha tudo para fazer tremer o Chile, mais uma vez.

O Quinteto de Ouro: Garrincha, Didi, Pelé, Vavá e Zagallo.



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