segunda-feira, 24 de março de 2014

1958 | Prazer, Pelé

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Irritado com o fato de ser chamado de “Pelé” na escola, Edson, ainda criança, deu um soco em um colega de classe e pegou dois dias de suspensão. A agressão lhe rendeu algumas palmadas de seu sempre rígido pai, Dondinho.

O apelido provinha do goleiro Bilé, titular absoluto do Vasco de São Lourenço (MG), time em que seu pai atuava antes de se transferir para o Bauru Atlético Clube. Fã do jogador, Edson, que também gostava de jogar no gol, anunciava a cada defesa nas peladas de rua: “Defende, Pilé!”, trocando a primeira letra do nome de seu ídolo.

O apelido pegou — a contragosto —, o menino cresceu e logo os campos de várzea da cidade estavam lotados para ver quem era o tal Pelé. As atuações espantosas rapidamente o transformaram em uma estrela da região.

Não demorou muito, o menino prodígio despertou o interesse dos grandes clubes. Foi parar no Santos e, por conta da velocidade que imprimia aos treinos, ganhou mais um apelido, menos conhecido, e que não vingou: “Gasolina”.

Convocado com 17 anos para a Copa de 58 — estreara na Seleção Brasileira um ano antes —, se machucou na véspera da competição, mas o chefe da delegação, Paulo Machado de Carvalho, insistiu em levá-lo mesmo assim. E na terceira rodada da fase de grupos, com o jogador totalmente recuperado de uma entorse de tornozelo, Pelé, enfim, era apresentado ao mundo.

Antes dos 14 anos, Pelé já jogava entre os mais velhos, em Bauru.

 Assombroso. Esse foi o adjetivo que a imprensa francesa usou para definir os primeiros três minutos de jogo do Brasil: uma bola na trave, duas boas defesas do lendário goleiro Yashin e um gol de Vavá — após passe de Didi. A União Soviética só passou do meio de campo aos 15min, mas sem conseguir furar o bloqueio brasileiro. E o primeiro tempo acabou 1 a 0.

O segundo tempo foi equilibrado até os 31min. O Brasil voltou a pressionar e chegou ao segundo gol em uma bela tabela entre Pelé e Vavá, que colocou para dentro: 2 a 0, placar final. Classificada em primeiro lugar para a fase seguinte, a Seleção Brasileira havia encontrado sua formação ideal.

Apesar da boa estreia de Pelé, com uma assistência para gol, quem roubou a cena foi outro estreante, Garrincha, dono de uma ginga inspiradora e dribles desconcertantes — mas essa é uma outra história.

Garrincha deixou dois soviéticos no chão em três minutos de jogo.

 A União Soviética ficou com a segunda vaga ao vencer a Inglaterra, por 1 a 0, no desempate, e o adversário nas quartas de final foi a Suécia. O time soviético reclamou muito do cansaço — havia jogado dois dias antes contra os ingleses — e acabou perdendo por 2 a 0, em Estocolmo, mesmo com um fraco desempenho dos donos da casa.

Inglaterra decepcionava mais uma vez; e a União Soviética, pela primeira vez.

 Já em Norrköping, o duelo entre França e Irlanda do Norte prometia ser disputado, por conta das peripécias do time bretão no torneio, mas não passou de um vareio de bola da seleção azul. Com dois gols de Fontaine — chegava a oito, no total —, a França goleou por 4 a 0 e pôs fim à ousadia norte-irlandesa.

Ainda pelas quartas de final, o golaço completamente sem ângulo do alemão Rahn, aos 12min, diante dos iugoslavos, foi a única coisa de bom que aconteceu na partida, em Malmö: vitória por 1 a 0 da atual campeã Alemanha Ocidental.  

O alemão Rahn classificou a Alemanha Ocidental para sua segunda semifinal consecutiva.

Sem Vavá, com um corte no tornozelo, o Brasil encarou o surpreendente País de Gales nas quartas de final. E a escola britânica, mais uma vez, deu trabalho para a seleção canarinho. A retranca galesa conseguiu segurar o ataque brasileiro no primeiro tempo, e a partida arrastou-se em um 0 a 0 perigoso até meados da segunda etapa.

Se Garrincha foi o nome do jogo contra os soviéticos, Pelé foi decisivo contra os galeses. Aos 21min, o camisa 10 entrou para a história como o mais jovem jogador a fazer um gol em Copas do Mundo: ele matou no peito, deu um balãozinho no zagueiro Charles e, deixando a bola quicar de leve no chão, chutou no canto do goleiro Kelsey, que nem se mexeu. 


O Brasil estava nas semifinais. E como seu pai imaginou quando lhe deu o nome — uma homenagem ao inventor da lâmpada —, Edson começava a brilhar.

Os jogadores se unem à Pelé, à bola e à rede na comemoração do gol sobre o País de Gales.


Para ler "1958 | Acelera, Brasil!", sobre a semifinal contra a França, clique aqui.