O Primo do Chico Bento
Nas histórias em quadrinhos, um personagem expressa diversos traços da autêntica
cultura brasileira: Chico Bento. O menino caipira é traquina,
brinca de roubar goiabas e é um aluno meio preguiçoso. Contudo, Chico é puro,
amoroso e religioso — tem até anjo da guarda —, mas com um lado espiritualista
alternativo que adora ouvir lendas de lobisomens e mulas sem cabeça.
Chico é, de certo
modo, um retrato do Brasil profundo. Um país jovem, quase infantil, que ainda
se surpreende com os encantos do mundo dito civilizado e urbano, mas que não
abre mão de uma vida simples e consideravelmente desregrada.
O contraponto a
isso é o primo Zeca. O parente cosmopolita de Chico Bento é quase sua antítese,
uma vez que reside em um moderno apartamento, estuda nas melhores escolas e tem
o hábito de viajar para várias partes do mundo. Alegoricamente este personagem
representaria a Austrália.
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A torcida animada da Austrália promete fazer muito barulho nos jogos contra Espanha, Holanda e Chile. |
O maior país da
Oceania, assim como nós, também é um país jovem e com histórico de colonização.
Entretanto, possui uma trajetória de desenvolvimento muito diferente em relação
ao Brasil. Sua densidade populacional é baixa, seu IDH é elevadíssimo e suas
preferências esportivas são outras heranças britânicas, como rúgbi, tênis,
críquete e golfe. Muitos diriam que a Austrália é o Brasil que deu certo, algo
certamente exagerado e superficial. Afinal, quem é mais feliz: o simplório
Chico Bento ou o modernoso Primo Zeca?
A discussão é
complexa, mas o fato é que no futebol, o êxito dos países apresenta papel
invertido, com ampla vantagem para o matuto. Se por um lado o Brasil é o maior
campeão da história das Copas e detentor do título de país do futebol, os
Socceroos apresentam no currículo um modesto vice-campeonato da Copa das
Confederações, em 1997 — um vareio de 6 a 0 contra o Brasil —, um quarto lugar
nos Jogos Olímpicos de 1992 e uma classificação as oitavas de final da Copa do
Mundo de 2006.
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ESSE CONHECE: Tim Cahill, 34, é a referência do time. O artilheiro australiano vai disputar a sua terceira Copa. |
Não é a toa que
este jovenzinho rico, mimado e bronzeado resolveu fazer intercâmbio e experimentar
a disputa das eliminatórias asiáticas, com o aval da titia FIFA. Afinal, nas
brincadeiras de seu continente, a Austrália representa o garoto mais velho,
alto, tatuado, forte e que faz o que quer com os colegas, rivalizando apenas
com o guri da rua de baixo, a Nova Zelândia.
Já na Ásia, a
Austrália encontra colegas do seu porte, o que, até o momento, não tem impedido
sua ida à grande festa, a Copa do Mundo. Esteve presente nas duas últimas
edições do Mundial, já concorrendo com rapazes narigudos, de olhos puxados e
afins. O time também se classificou para a Copa da Alemanha Ocidental, em 1974,
ano em que a FIFA iniciava sua cruzada pelos cinco continentes, em busca de um
Mundial mais globalizado e de votos para a perpetuação no poder de certos dirigentes.
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FIQUE DE OLHO em Tommy Oar. Jogador de Utrecht desde os 18 anos, hoje, com 22, é a grande aposta do técnico greco-australiano. |
Hoje, o time vem à
Copa como um adolescente ingênuo nas ardilosas esquinas do mundo da bola, as
quais o Brasil conhece cada palmo. Para isso, trouxe na sua turma de garotos os
mais experientes: Tim Cahill, Mark Bresciano e o capitão Mile Jedinák. No
entanto, saber beber/jogar não é suficiente para se aproximar da desejada
musa/taça. Ainda mais enfrentando o campeão e o vice do último baile, além do
promissor e também descolado Chile.
Resta à Austrália
aproveitar a viagem para conhecer mais macetes a fim de conquistar a mãe da
linda garota Taça, a Dona Bola. Só ela permitiria um passeio de quatro anos ao
lado da dourada menina dos olhos de todo o planeta. A concorrência está grande,
é verdade, e os meninos do bumerangue ainda estão decorando o que dizer à
redonda — provavelmente em vão. Na roça do futebol, até o Zé Lelé (Argentina)
tem mais chances de conquista que o metódico e inexperiente primo Zeca da
Oceania.
NO ESQUEMA: 4-2-1-3
Com um técnico grego à frente da equipe, Ange Postecoglou, não poderia ser diferente o sistema de jogo australiano: marcação cerrada. A ordem é pressionar a saída de bola do adversário. No resto, bola no Tim Cahill.
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4-2-3-1 (clique para ampliar) |
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Histórico em Copas (clique para ampliar) |
Rafael Bauer, professor de turismo e turista profissional
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